Minha experiência com psiquiatras – O peso de uma sombra V

Não sou psiquiatra, psicólogo ou terapeuta. O texto a seguir não é uma recomendação, confirmação e/ou contestação de coisa alguma. Trata-se apenas de algumas exposições pessoais sobre o tema da depressão e outros correlatos.

Você já se consultou com um psiquiatra? Faz ideia de como é a consulta com um psiquiatra? Tem aquele pensamento tolo de achar que o psiquiatra é um “médico de malucos”? Tem receios? Acha que não vai ajudá-lo em nada? Já se consultou com um e detestou? Foi bem atendido?

Este artigo será bem leve, sem termos técnicos, chavões da área ou algo parecido com isso. A intenção é compartilhar.

Eu já passei por cada uma dessas experiências. Foi um longo caminho até encontrar o profissional certo para mim. Lembro da primeira médica que me atendeu e como eu não tinha a menor ideia de como seria. O que eu preciso falar? O que ela vai me dizer? Será que ela já vai me receitar algum medicamento? Mas aconteceu algo um pouco diferente quando me encontrei com ela, um detalhe que fez toda a diferença e que comentarei em outro momento.

Faço um parêntese aqui: além da depressão, havia um outro motivo que acabou me levando ao encontro de um profissional da área: a suspeita de eu ser um portador da chamada síndrome de Asperger (isso aconteceu antes das mudanças na DSM – Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders ou Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) e com base nisso ela foi indicada. Mas tudo isso será explanado mais tarde em uma série de textos sobre TEA, o Transtorno do Espectro Autista.

Mas voltemos ao assunto do texto de hoje; deixe-me compartilhar com vocês um pouco do que passei tentando encontrar o melhor profissional para me ajudar. Não citarei nomes ou locais, claro.

Minha experiência com psiquiatras

Primeiro psiquiatra (simpática e útil)

A primeira profissional que me foi indicada e com quem tive uma sessão era uma moça simpática e de sorriso calmo que me recebeu muito bem. Mas havia um pequeno porém: a especialidade dela era psiquiatria infantil (eu já tinha mais de 30 anos na época). Ela pôde esclarecer vários pontos sobre depressão e TEA e recomendou uma terapeuta especializada em pessoas com a assim chamada síndrome de Asperger. Escreverei mais sobre essas consultas (com a psiquiatra e com a terapeuta indicada por ela) em um texto futuro.

Segundo psiquiatra (razoável por um lado, ruim por outro)

Seguindo a indicação da primeira psiquiatra, eu conheci a terapeuta que indicou o segundo profissional que me atendeu, especificamente, sobre a depressão. Era um homem de mais ou menos 50 anos que se mostrou muito profissional. Seco, mas profissional. Foi atencioso, mas, ao mesmo tempo, um tanto robótico; dava mais atenção ao computador do que a mim durante as “conversas” que tivemos. Talvez “entrevistas” seja um termo melhor; ele perguntava, eu respondia e às vezes ele fazia um comentário. Indicou um remédio que funcionou muito bem (pelo menos durante um certo tempo) e, quando eu tinha algumas dúvidas e lhe mandava uma mensagem, ele as respondia bem rápido.

Quando o medicamento começou a ter um efeito rebote e tudo começou a desandar, a minha vida já estava confusa de novo, e acabei simplesmente largando o tratamento e nunca mais voltei. Mas não tenho muito o que reclamar do psiquiatra. Seria ruim para algumas pessoas e bom para outras, como quase todo mundo.

Terceiro psiquiatra (péssimo)

Após um grande intervalo de tempo (anos), eu resolvi tentar de novo e buscar outra pessoa para me ajudar. E acabei encontrando o pior médico dessa lista. Mas por que era tão ruim? Vou contar.

Poucas vezes vi um médico tão seco e antipático. E calado, um psiquiatra calado! Como pode alguém que trabalha em uma especialidade dessas não se esforçar um pouco que seja para ter uma boa relação com seus pacientes? Você estuda para ser alguém que ajudará pessoas mentalmente instáveis e emocionalmente destruídas e então você age da maneira mais detestável e desinteressada possível? Não faz o menor sentido. Deveria ter se tornado médico legista e não psiquiatra.

Assim que me sentei, ele virou a sua atenção para o computador e iniciou uma bateria de perguntas; perguntas padronizadas idiotas do tipo “você já sofreu bullying?” que lia da tela da máquina. Aliás, o computador tinha 95% da atenção do sujeito e parecia ser o verdadeiro paciente na sala. Quando respondi que sim, já tinha sofrido bullying e completei “não sei se isso é tão importante assim, quase todo mundo já sofreu bullying em algum momento”, isso deve ter incomodado o ego do sujeito, pois seu tom de voz se tornou ainda mais arrogante.

Por falar em ser arrogante, em 15 minutos, o cara já tinha certeza de que eu não era autista. Um diagnóstico que levou anos e alguns profissionais para ser alcançado foi destruído com base em alguns minutos de perguntas genéricas. Foi algo como concluir que sou ambientalista porque a minha cor preferida é verde. É sério, foi exatamente nisso que pensei. Lamento não ter dito na cara da criatura, mas eu estava esgotado.

( Créditos: domínio público)

Não sei vocês, mas eu acho impressionante alguém passar todas essas impressões ao mesmo tempo em que ficava calado a maior parte das sessões (eu ainda fiz a maluquice de voltar uma segunda vez antes de sumir). No fim, vi pouco nele além do que chamo de médico receitador de remédios; o que menos interessava era eu, o paciente (na verdade, ele não parecia se interessar em nada). Talvez existam especialidades que não necessitem de interação humana e empatia, mas a psiquiatria, com certeza, não pode ser uma delas. Dava pra sentir nele uma tremenda falta de calor humano. Até pra mim, uma pessoa emocionalmente distante, isso ficou evidente. A sombra adorou.

Quarto psiquiatra (finalmente deu certo)

É uma pena eu não poder citar o nome da minha médica atual, porque eu gostaria de recomendá-la a todos. Sem o risco de cometer algum exagero, ela salvou minha vida, deu uma direção para a minha recuperação.

Ela é uma junção das qualidades dos dois primeiros psiquiatras que me atenderam. Atenciosa, mesmo fora dos horários das sessões, CONVERSA comigo sobre meus problemas e meus progressos, é humana, não me abandona na sala pra mexer em computador, tablet ou algo do tipo e foi certeira sobre a minha medicação (até hoje não precisei mudar remédio ou dose).

Ela foi indicada a mim por um amigo que ficou sabendo dela por meio de um colega que havia recebido, recentemente, um laudo atestando seu autismo. Por isso ele se lembrou de comentar comigo a respeito. Eu resolvi tentar de novo e não me arrependi. A importância de se ter uma rede de contatos se prova novamente. Até eu reconheço isso.

Além da depressão e do autismo, foi ela também que identificou outros problemas meus que foram atestados depois, como TDAH (Transtorno de Deficit de Atenção e Hiperatividade) e TOC (Transtorno Obsessivo-compulsivo). Isso resultou em outro salto de qualidade de vida pra mim.

Houve tropeços durante meu tratamento com ela? Sim, mas foram todos de responsabilidade minha (reduzir dose de remédio por conta própria, não seguir indicações sobre higiene do sono e coisas do tipo). Se eu fizesse 100% do que ela me diz, a sombra já teria sido domada há tempos.

Nesse exato momento estou plenamente satisfeito em como tudo está caminhando. Obrigado, Dra!

Autor: Yori R. Santos-Ramos

Leia todos os artigos de Yori. Acesse pelos links abaixo:

  1. I – Depressão
  2. II – Os efeitos da depressão
  3. III – Erros ao lidar com a depressão
  4. IV – O que não dizer a alguém com depressão

E fique à vontade para conhecer todas as colunas de nosso blog:

4 comentários em “Minha experiência com psiquiatras – O peso de uma sombra V”

  1. É gratificante quando encontramos real interesse no médico que nos atende. O médico que não tem essa postura deveria passar por um treinamento, não sei se o nome seria esse.

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    • Incrível a gente chegar ao ponto de ter que considerar um treinamento específico para que o médico seja humano, não? Ainda mais nessa especialidade que age tão próximo do paciente.

      Obrigado pelo comentário.

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  2. eu tive algumas experiências ruins e agradeço por vc compartilhar essa parte da sua vida. o primeiro psiquiatra que levei minha filha presenciei algo que me fez nunca mais voltar. um casal com seu filho , um jovem de aproximadamente 16 anos, vestido de preto, ar debochado, saiu da sala do médico,passou por nós na sala de espera, em seguida a mãe e por último o pai. no que o pai saiu o elevador já havia descido com mãe e filho. pasmem! o pai desceu e voltou no mesmo momento e fala assim: o médico disse que se eu precisasse de ajuda era só fazer contato.. pois bem estou precisando agora. A secretária entrou no consultório, o paciente entendeu a urgência e deixou o pai conversar. O pai disse que o rapaz estava quebrando a portaria e iam chamar a polícia. O médico só disse que era para deixar quebrar e que chamassem a polícia, não deu nenhum suporte para família.
    O segundo psiquiatra a cada mês aumentava a dose de um determinado remédio, minha filha na época só tinha 14 anos e passou a viver com remédio no bolso.
    Antes de completar 16 a psicóloga dela sugeriu uma psiquiatra, a levei e está até o momento, ainda não chegou no ideal, mas sem dúvida avançou. agora vou esbarrar em como continuar o tratamento, a consulta é muito cara. mas vamos em frente.

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    • Essa do psiquiatra falar pra deixar o cara quebrar tudo e chamar a polícia (enquanto lavava as mãos pra família) foi de doer. Quanto ao outro caso infelizmente eu vejo muitas reclamações desse tipo por aí: o médico que parece um mero receitador de remédios. Agradeço o comentário e espero que encontre o melhor custo-benefício nessa situação.

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